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BOSCOVITCH

Posted by Consphirayshion | Posted on 03:37

Um tema de ficção científica: se os relativistas têm razão,
se vivemos num Universo de quatro dimensões, e se pudéssemos
disso tomar consciência, aquilo a que chamamos o senso comum
estoiraria. Autores de antecipação esforçam-se por pensar em
termos de espaço-tempo. Aos seus esforços correspondem, num
plano de investigação mais puro e numa linguagem teórica, os dos
grandes físico-matemáticos. Mas será o homem capaz de pensar
em quatro dimensões? Ser-lhes-iam necessárias outras estruturas
mentais. Essas estruturas estarão reservadas para o homem a
seguir ao homem, o ser da próxima mutação? E esse homem
a seguir ao homem estará já entre nós? Romancistas do fantástico
afirmaram que sim. Mas nem Van Vogt, no seu belo livro fantástico
sobre os Slans, nem Sturgeon, na sua descrição dos mais
que Humanos, ousaram imaginar uma personagem tão fabulosa
como Roger Boscovitch.
Homem que teria sofrido uma mutação? Viajante do Tempo?
Extraterrestre camuflado atrás desse Sérvio misterioso?
Boscovitch teria nascido em 1711 em Dubrovnik: é pelo
menos o que ele declarou, aos catorze anos, ao inscrever-se
como estudante voluntário no colégio jesuíta de Roma. Ali estudou
matemática, astronomia e teologia. Em 1728, tendo terminado
o seu noviciado, entrou na ordem dos Jesuítas. Em 1736 publica
uma comunicação sobre as manchas do Sol. Em 1740 ensina
matemática no Collegium Romanum, depois torna-se conselheiro
científico do Vaticano. Cria um observatório, empreende a drenagem
dos Pântanos Pontinos, cerca de Roma, restaura o zimbório
de São Pedro, mede o meridiano entre Roma e Rímini sobre dois
graus de latitude. Depois explora diversas regiões da Europa e da
Ásia e faz pesquisas sobre os próprios locais onde Schliemann,
mais tarde, descobrirá Tróia. É nomeado membro da Real Sociedade
de Inglaterra, a 26 de Junho de 1760, e nessa ocasião
publica um longo poema em latim, sobre as aparências visíveis
do Sol e da Lua, de que os contemporâneos dizem: "É Newton
na boca de Virgílio". É recebido pelos maiores eruditos da época,
e mantém inclusivamente uma importante correspondência com
o doutor Johnson e com Voltaire. Em 1763, a nacionalidade francesa
é-lhe oferecida. Toma a direcção do departamento de óptica
da Marinha Real, em Paris, onde viverá até 1783. Lalande considera-o
o maior sábio vivo. D'Alémbert e Laplace ficarão apavorados
com as suas ideias avançadas. Em 1785 retira-se para
Bassano e consagra-se à impressão das suas obras completas.
Morre em Milão em 1787.
É muito recentemente, sob o impulso do governo jugoslavo,
que acaba de ser reexaminada a obra de Boscovitch e principalmente
a sua Teoria da Filosofia Natural', editada em Viena
em 1758. A surpresa foi considerável. Allan Lindsay Mackay,
' Theoria philosophiae naturalis redacta ad unicam legem virium in
naiura exisientium.
ao descrever essa obra num artigo do New Scientist de 6 de
Março de 1958, acha que se trata de um espírito do século xx
forçado a viver e trabalhar no século xvIII.
Verifica-se que Boscovitch estava em avanço, não apenas
quanto à ciência do seu tempo, mas quanto à nossa própria ciência.
Ele propõe uma teoria unitária do universo, uma equação geral
e única, que comandaria a mecânica, a física, a química, a biologia
e mesmo a psicologia. Nessa teoria, a matéria, o espaço e o tempo
não são divisíveis até ao infinito, mas compostos por pontos: por
grãos. Isto faz lembrar os recentes trabalhos de Jean Charon e
de Heisenberg, que Boscovitch parece ultrapassar. Ele consegue
dar conta tanto da luz como do magnetismo, da electricidade e
de todos os fenómenos da química conhecidos no seu tempo, descobertos
depois ou a descobrir. Encontram-se nos seus trabalhos
os quanta, a mecânica ondulatória, o átomo constituído por
nucleões. O historiador das ciências L. L. Whyte afirma que Boscovitch
ultrapassou pelo menos em duzentos anos a sua época,
e que ele só poderá realmente ser compreendido quando a junção
entre a relatividade e a física dos quanta for enfim elaborada.
Pensa-se que em 1987, quando do 200.o aniversário da sua morte
talvez a sua obra esteja avaliada com a justiça que lhe é devida.
Ainda não foi proposta qualquer explicação para este caso
prodigioso. Duas edições completas da sua obra, uma em sérvio,
outra em inglês, estão actualmente em preparação. Na correspondência
já publicada (colecção Bestermann) entre Boscovitch
e Voltaire pode ler-se, entre outras ideias modernas:
- A criação de um ano geofísico internacional.
- A transmissão da malária por intermédio dos mosquitos.
- As possíveis aplicações do cauchu (ideia posta em prática
por La Condamine, jesuíta amigo de Boscovitch).
- A existência de planetas em volta de outras estrelas além
do nosso Sol.
- A impossibilidade de localizar o psiquismo numa dada
região do corpo.
- A conservação do "grão de quantidade" de movimento
no Mundo: é a constante de Planck,.enunciada em 1900.
Boscovitch atribui uma importância considerável à alquimia
e dá traduções claras, científicas, da linguagem alquímica. Para
ele, por exemplo, os quatro elementos, Terra, água, Fogo e Ar,
apenas se distinguem por coordenações especiais das partículas
sem massa nem peso que os constituem, o que concorda com
a investigação de vanguarda sobre a equação universal.
O que é igualmente alucinante em Boscovitch é o estudo
dos acidentes da natureza. Já ali se encontra a mecânica estatística
do sábio americano Willard Gibbs, proposta no final do
século xix e admitida apenas no século xx. Ali se encontra
também uma explicação moderna da radioactividade (perfeitamente
desconhecida no século xvIII) por uma série de excepções
às leis naturais: aquilo a que nós chamamos "as penetrações
estatísticas das barreiras do potêncial".
Por que motivo esta obra extraordinária não influenciou o
pensamento moderno? Porque os filósofos e sábios alemães, que
dominaram a investigação até à guerra de 1914-1918, eram partidários
das estruturas contínuas, enquanto as concepções de Boscovitch
se baseiam essencialmente na ideia de descontinuidade.
Porque as investigações em bibliotecas e os trabalhos históricos
a respeito de Boscovitch, grande viajante de obra dispersa,
e cujas origens se situam num país constantemente agitado, não
puderam ser elaboradas sistematicamente senão demasiado tarde.
Quando a totalidade dos seus escritos pudere ser reunida, quando
os testemunhos de contemporâneos tiverem sido encontrados
e classificados, que estranha, inquietante, assombrosa figura nos
surgirá!

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